O Campeonato Brasileiro de League of Legends (CBLOL) chegou ao fim, depois de 24 edições ao longo de 13 anos de existência, para dar lugar a uma competição continental mais enxuta a partir de 2025. Mesmo popular, o CBLOL não conseguiu transformar audiência em dinheiro capaz de salvá-lo da crise dos esportes eletrônicos.
Realizado pela primeira vez em 2012, em um estande na Brasil Game Show (BGS), em São Paulo, o CBLOL ganhou evento próprio em 2013, chegou a arenas esportivas em 2014, começou a ser disputado como liga em 2015, passou por diferentes estados e virou franquia em 2021, tornando- se o produto de esports mais longevo no Brasil.
Em popularidade, o CBLOL bateu recordes de visualizações nos últimos anos, mantendo-se relevante mesmo com a queda generalizada nos índices de audiência dos esports. Mais do que isso, criou uma comunidade fiel e apaixonada e viu a consolidação de torcidas para os clubes, em contraste com o hábito antigo de torcer por jogadores.
Tão logo o público se conformou com a ideia de que os times brasileiros jamais conseguiriam bons desempenhos internacionais, dado o desenho do circuito competitivo, nada estimulante à competitividade, o CBLOL acabou forçado a ser suficiente em si próprio.
Não é por outro motivo que o CBLOL adotou o slogan de “ser diferente”. Com a sempre engajada torcida brasileira e sem a possibilidade de almejar resultados esportivos, restou o entretenimento, que se tornou o principal atrativo do campeonato.
Historicamente reticente com co-streams, a Riot Games no Brasil teve até de abdicar da exclusividade da transmissão para dividi-la com streamers, em uma tentativa de ganhar capilaridade durante o aumento das preocupações quanto ao futuro.
Presentes no Valorant desde o começo, as co-streams só foram adotadas no cenário internacional em 2023 e, no Brasil, em 2024. Na balança, a necessidade de alcançar público maior pesou mais do que o receio de as co-streams, com conteúdo sobre a qual a empresa não exerce controle direto, canibalizarem a transmissão principal.
Em âmbito internacional, a desenvolvedora norte-americana já vinha dando sinais de retração há anos, com o encerramento ou a fusão de ligas de baixa audiência ou insustentáveis financeiramente.
O Worlds, o Campeonato Mundial de LoL, que chegou a ter 24 times, de 14 regiões, em 2018, contará com 17 participantes, de só cinco regiões, no ano que vem.
Em meio a uma crise de popularidade e de finanças que assolou a LCS, a liga da América do Norte, o chefe do CBLOL, Carlos Antunes, virou líder de e-sports do LoL nas Américas, o que reforçou os temores de que o campeonato brasileiro poderia ser unificado com o norte-americano.
Nas primeiras manifestações após ser anunciado no cargo, em agosto de 2023, o executivo brasileiro tratou de negar que haveria uma unificação nas Américas. “CBLOL para sempre”, chegou a escrever Caco, como é conhecido, nas redes sociais.
Mas as declarações envelheceram muito mal. Menos de um ano depois, houve o anúncio de que o CBLOL passaria a integrar uma Liga das Américas como uma Conferência Sul, com espaço para só seis times brasileiros fixos.
Em novo processo seletivo, assim como o realizado para entrada na franquia, quatro clubes darão adeus ao circuito oficial do LoL. E, com eles, jogadores, treinadores e outros profissionais do ecossistema.
Como principal justificativa para a unificação está a questão econômica. A Riot, que sempre tratou os e-sports como parte do investimento de marketing por eles serem deficitários, admitiu publicamente que o CBLOL era insustentável financeiramente.
O modelo de negócio, com patrocínios e divisão das receitas obtidas com os patrocinadores do CBLOL, não se pagou. Até mesmo organizações de grande porte, ainda que tenham segurança financeira, enfrentam dificuldades para fechar as contas no azul.
O boom vivenciado na pandemia, com empresas apostando alto nos esports, não se solidificou. Na queda livre dos investimentos, primeiro as empresas de criptomoedas e depois as casas de apostas viraram tábuas de salvação para os clubes sobreviverem à tormenta.
No novo modelo de negócios, os clubes da Liga das Américas receberão uma parte das receitas obtidas com a comercialização de produtos digitais. A Riot acredita que, com menos organizações com quem dividir o bolo, as fatias serão maiores para as que restarem, em um contexto em que a desenvolvedora proíbe, resistindo a enorme pressão, que os times de LoL sejam patrocinados por casas de apostas.
O rearranjo do ecossistema competitivo fez que acontecesse o que o sucessor de Caco como chefe do CBLOL, Igor Corrêa, chegou a negar categoricamente que aconteceria, alegando que o campeonato era “muito sólido como produto”.
Apesar de o executivo ter garantido que o torneio brasileiro não seria integrado a outra liga e não perderia vagas diretas nos campeonatos internacionais, isso aconteceu.
No primeiro, dos três splits regionais, só uma equipe das Américas irá para o campeonato internacional inicial da temporada. No Mid-Season Invitational (MSI), serão duas representantes, uma de cada conferência (Norte e Sul). Para o Worlds, as Américas mandarão três times, com ao menos um de cada conferência.
O ponto é que, na Conferência Sul, da qual o CBLOL fará parte, haverá pelo menos uma equipe latino-americana competindo. Isso significa que, no caso das classificações tanto para o MSI quanto para o Worlds, existe a possibilidade, ainda que remota, de nenhum brasileiro conseguir.
Esse pior cenário seria uma catástrofe, fazendo o Brasil, já tão mal-sucedido em palcos internacionais, retroceder a 2013, a primeira e última vez em que o país não participou do Worlds porque a representante brasileira da época, a paiN Gaming, não passou do Wildcard, o antigo torneio classificatório para regiões emergentes.
Se as campanhas internacionais nunca foram capazes de dar uma vaga adicional ao Brasil nos principais torneios mundiais, também a apaixonada comunidade brasileira não impediu o CBLOL de ser rebaixado no circuito competitivo. No máximo, evitou corte ainda maior. Se o CBLOL não fosse tão popular, o Brasil poderia perder mais espaço.
Depois de anos exaltando os torcedores brasileiros, a Riot os decepcionou e, de certa maneira, os traiu ao acabar com o torneio que é a razão da existência da comunidade. No fim, como em toda empresa, o capital se impôs.
O slogan ufanista de que “a CBLOL (comunidade brasileira) é que faz o CBLOL (campeonato brasileiro)” ser o que é (ou era) deu lugar à realidade, restando à Riot recorrer ao “CBLOL é nóis”, em um estímulo ao sentimento de pertencimento que não serviu de nada para salvar o campeonato de pagar o preço da crise.
Matéria disponível em: https://ge.globo.com/esports/blogs/por-dentro-dos-esports/post/2024/09/09/popular-mas-insustentavel-cblol-paga-preco-da-crise-nos-esports.ghtml