O texto a seguir foi enviado via forms de contato do BoletIME e não necessariamente condiz com a opinião do corpo editorial.
Durante todo o período que passei no IME, a USP entrou em greve diversas vezes, mas o IME não ingressou no movimento. Talvez por estudantes conformados, talvez por falta de tempo, ou por diversas outras razões que não cabe a mim julgar.
Agora, a considerar pela minha experiência e observação das indignações dos meus colegas de outros cursos que não o BCC (meu curso), muitos estudantes passam por questões que foram normalizadas no nosso ambiente diário, mas não são normais. Não são saudáveis. O problema é que estamos cansados demais para convencer estudantes que não sentem esse impacto negativo como nós e tem condições de sobreviver à situação.
A USP é uma universidade de respeito internacional e isso se deve principalmente ao trabalho acadêmico de extrema relevância e qualidade produzido. No entanto, ao meu ver, a questão da didática, da atuação como professores, tem muito a melhorar. Em cursos não "abraçados" pelo mercado o investimento é precário. Em cursos nos quais esse problema não ocorre, os professores podem ser egocêntricos a ponto do orgulho sobressair ao amor pelo ensino. Não é fácil ingressar na USP, e infelizmente também não é fácil sair dela.
Na minha visão, os problemas foram se agravando com os anos, até se tornar insustentável. Há pessoas que não conseguem se formar pela escassez de professores para oferecer uma disciplina. Há professores que mal podem ter uma vida pessoal devido a quantidade de disciplinas que precisam administrar. E isso não é uma questão exclusiva dos professores do IME. Nós temos disciplinas ministradas por professores de outros institutos mais banalizados que o nosso, e a precarização desses institutos também nos afeta. Essa greve, mais que por um motivo de união da universidade pelos direitos básicos de todos, também é uma luta pelos nossos direitos diretamente.
Não podemos continuar nos conformando com o básico, ter o mínimo para nos formar sacrificando nossa saúde mental, não é ideal em uma universidade como a que estamos de tamanha importância. "Você é muito inteligente, estuda na USP", mas na USP nos sentimos muitas vezes insuficientes e inúteis. A questão não é sobre dificuldade, sobre desafios. A questão é sobre ser cobrado por coisas não ensinadas, ser exigido tempo que não temos, ser impedido de ter entretenimento pela não reprovação.
Através da comparação com experiências pessoais, ao ingressar no mercado de trabalho, me senti muito mais produtiva, o que na sociedade atual infelizmente é "essencial". Me senti desmotivada a continuar a graduação, e entendi o motivo de tantos colegas abandonarem a graduação ao começarem a trabalhar. O mercado apresenta desafios, dificuldades e aprendizados, mas ele também te da a oportunidade de crescer, e sentir o impacto do seu esforço. Isso, infelizmente, não acontece em diversas disciplinas. O IME tem professores maravilhosos, mas tem professores cujas reclamações são quase generalizadas. E o problema: não temos a possibilidade de outro docente oferecer essa disciplina, pois não há mais voluntários para tal.
Essa greve, ao meu ver, nos deu espaço para reivindicar questões prejudiciais há muito tempo presentes, e nos conformar com o mínimo significa condenar os próximos estudantes a continuar sobrevivendo, da mesma forma que nós fizemos. Como quase formanda, trabalhando, e finalizando o curso, a participação ativa é quase impossível para mim, e acredito que muitos passam pelo mesmo. No entanto, acompanhar as notícias, e sobretudo, apoiar os estudantes que estão dedicando grande parte de seu tempo e energia por um bem comum, se torna um ato de empatia. Devemos aproveitar o caos da situação atual para melhorar o máximo de problemas possíveis. Por mais que não participando ativamente, temos representantes que defenderão nossas questões, mas para isso precisamos manifesta-las.
Com isso, convido a todos que não conseguem estar nas assembleias, nos piquetes, a se comunicar com os líderes do IME na greve. Convido também àqueles que viraram noites, choraram, tiveram crises de ansiedade, não visitaram parentes, não saíram com a família e amigos, pois precisavam se dedicar a uma disciplina, a analisar o quão "normal" é essa situação em uma universidade de tamanho respeito.
Em relação ao semestre, e à carta da reitoria sobre o final das atividades no dia 22 de Dezembro, entendo docentes que estão dando aulas flexibilizadas com o intuito de finalizar o conteúdo do semestre e não prejudicar os estudantes.
A greve foi necessária, e ainda é. É a maneira que temos de pressionar aqueles que detém mais poder a ceder às nossas reivindicações.